sábado, 13 de novembro de 2010

POBREZA, DESIGUALDE E SERVIDÃO


O Brasil tem um problema gravíssimo de distribuição de renda. De acordo com o índice de Gini, nosso país está entre os mais desiguais do mundo, ficando atrás apenas de alguns poucos países muito pobres da África e América Latina. Quando um país tem uma renda per capita não muito alta e uma elevadíssima desigualdade, qual será o resultado? Um grande número de pessoas pobres. Essa é a situação do Brasil.

A pobreza é indesejável porque é injusta, economicamente ineficiente e politicamente temerária. É injusto que uma pessoa não tenha condições para custear minimamente sua alimentação, moradia, serviços de saúde e estudo. Quando uma pessoa é privada de suas necessidades elementares, não pode se desenvolver plenamente. A pobreza faz com que os recursos humanos de uma nação sejam desperdiçados, logo gera ineficiência econômica. Além disso, a pobreza gera instabilidade social, pois quanto maior a desigualdade, maior tende a ser a violência e a criminalidade. Finalmente, pessoas muito pobres, com baixa instrução, são normalmente pouco informadas e mais facilmente manipuláveis por maus representantes políticos.


A pobreza é indesejável porque é injusta, economicamente ineficiente e politicamente temerária.

A situação social no Brasil é grave, mas tem melhorado. Um dos fatores que tem contribuído para melhorar o quadro social no Brasil são as políticas de complementação de renda, que recentemente foram unificadas em um só programa, batizado pelo governo de Bolsa Família. Esse programa tem aspectos positivos e negativos. Por incrível que possa parecer, a matriz teórica desse programa está contida nas idéias de um dos papas do neoliberalismo, o economista norte-americano Milton Friedman. Em seu livro, Capitalismo e Liberdade, Friedman discute a questão da desigualdade de renda e riqueza no capitalismo. Friedman argumenta que para ele - ferrenho defensor do liberalismo - é difícil encontrar argumentos éticos favoráveis a uma redistribuição da renda. Todavia, se essa política for implementada, que ela funcione como uma espécie de imposto de renda negativo. Ou seja, pessoas muitos pobres, em vez de pagar imposto de renda, recebem um subsídio do governo. Quanto menor a renda, maior a transferência que a pessoa terá direito. Segundo o autor, essa política respeita o direito de escolha do consumidor. Em vez de o governo oferecer bens ou serviços gratuitamente, é melhor que a pessoa receba uma ajuda em espécie e escolha livremente qual a melhor forma de alocar esse recurso.


Milton Friedman: por incrível que pareça, a matriz teórica do Bolsa Família está contida nas idéias de um dos papas do neoliberalismo.

Esse é o primeiro aspecto positivo dos programas de complementação de renda. Ao conceder uma ajuda em espécie, o governo respeita a soberania do consumidor. Ninguém melhor que o próprio consumidor sabe quais suas reais necessidades. Para ilustrar essa situação, imaginemos um caso bem simples, porém esclarecedor. Suponha que o governo ajude famílias pobres distribuindo cupons de alimentação que as pessoas trocam por comida em supermercados. Suponhamos agora uma pessoa muito pobre e sem dentes. Tão importante quanto os alimentos para essa pessoa, seria uma dentadura. Nesse caso, uma ajuda em dinheiro é mais eficiente que um cupom de alimentação. Quando o governo dá dinheiro no lugar de cupons, permite que a pessoa escolha a melhor maneira de alocar sua renda.

O segundo aspecto positivo dos programas de complementação de renda está na focalização. Esses programas são eficientes porque não são universais (oferecidos a todos), eles estão focados nos mais pobres. Por exemplo, suponhamos que, em vez de complementar renda, o governo escolha subsidiar a produção de alguns alimentos, tornando-os mais baratos. Essa política é menos eficiente porque é universal. Tanto pobres como ricos seriam favorecidos pelos preços mais baixos dos alimentos.
Todavia temos de ficar atentos para os aspectos negativos. No meu entendimento, esses programas somente são aceitáveis por um determinado período de tempo. É injusto e moralmente perigoso que uma parcela da população dependa de assistência pública para sobreviver. Eu diria até que isso é uma afronta à dignidade humana. O Bolsa Família é bom, tem contribuído para reduzir a pobreza no Brasil, mas esse programa tem de ter uma porta de saída. Não é bom que algumas pessoas incorporem uma cultura do assistencialismo e passem a achar que têm o direito de serem sustentadas pelo governo. Um governo paternalista que trata cidadãos como criancinhas é moralmente perigoso, corre-se o risco de se estabelecer uma promiscua relação de dependência entre as camadas mais pobres da população e o governo. Os beneficiários podem se tornar lenitivos com tudo que o governo venha a fazer, desde que o programa seja mantido. De forma bem clara, os beneficiários do programa não se importarão se o governo é corrupto, aparelha a máquina estatal, censura a imprensa ou comete outros tantos desvios morais. Tudo isso é permitido desde que o auxilio seja mantido. Quando as coisas chegam a esse patamar, cria-se um forte estímulo à degeneração política.
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O Bolsa Família é bom, tem contribuído para reduzir a pobreza no Brasil, mas esse programa tem de ter uma porta de saída.

Minha posição é de que o Bolsa Família é um bom instrumento de combate à pobreza, mas que pode se transformar em algo perigoso no longo prazo. O quadro de pobreza que vigora no Brasil é imoral, indigno, obsceno, mas temos que entender que renda e riqueza são resultado do jogo econômico. Algumas pessoas são mais esforçadas que outras, portanto não é justo redistribuir renda, o correto é redistribuir oportunidades. A melhor maneira de lidar com essa questão é focar na origem primordial do problema. Existe tanta pobreza no Brasil porque as pessoas que participam do jogo partem de situações extremamente desiguais. A melhor política de combate à pobreza está no investimento em educação. Se todos os brasileiros tivessem acesso a uma educação de qualidade, a desigualdade se reduziria naturalmente, sem atropelos morais. Pessoas com mais educação também tendem a compreender melhor a política e a aceitar menos os desvios éticos do governo. A solução, portanto, está na educação. Qualquer governo que não dê a devida atenção a esse problema e insista em políticas assistencialistas deve ser visto com cautela.



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