quinta-feira, 28 de outubro de 2010

BRASIL ESTÁ FORA DO RANKING DAS 200 MELHORES UNIVERSIDADES DO MUNDO


O Brasil está mal no Ranking Mundial de Universidades 2010-11, elaborado pela Times Higher Education, publicação especializada em ensino superior do jornal inglês The Times. A universidade brasileira mais bem posicionada nesse ranking é a Universidade de São Paulo (USP), que ocupa a 232ª posição. Será que é normal um país que está entre as dez maiores economias do mundo não ter uma única universidade que figure entre as 200 melhores? Você pode achar que sim, afinal somos um pais em desenvolvimento. Bem, a China, que também é um país emergente, tem quatro universidades entre as 50 melhores do mundo. Quem você acha que está se preparando de fato para ser uma potência econômica nos próximos anos? Há muita coisa errada com a nossa educação, começando pelo ensino básico e terminando na pós graduação. Mas hoje vou escrever sobre ensino superior.


HAVARD: A MELHOR DO MUNDO


As melhores universidades brasileiras são públicas, salvo algumas poucas exceções. As públicas são as melhores do Brasil, mas ficam muito atrás das melhores do mundo. Qual a razão disso? Será que nós brasileiros somos menos inteligentes, menos capazes? Não é nada disso, no Brasil há pessoas tão inteligentes como em qualquer lugar do mundo. O nosso problema não está na falta de recursos, mas na forma como esses vêem sendo utilizados. Uma universidade pública funciona como uma empresa estatal, o professor é um servidor público, aprovado em concurso e com estabilidade garantida por lei. Como todos sabem, um dos vícios do funcionalismo público de um modo geral é a baixa produtividade. Trabalhadores têm de ser recompensados de acordo com a produção, quem produz mais, recebe mais. Em qualquer empresa privada as coisas funcionam mais ou menos assim. Vendedores recebem comissão sobre vendas, é um incentivo para vender mais. Um executivo de uma empresa multinacional vai receber bônus de acordo com os lucros que a empresa obtiver no ano. Você já ouviu alguém dizer que isso é injusto, errado, inadequado, ou seja lá o que for? Não, porque é algo que evidentemente funciona.

É lógico que na prática sempre haverá imperfeições. Mesmo em empresas privadas algumas pessoas conseguem galgar posições utilizando-se de contatos com pessoas influentes, bajulação, trapaça, etc. A conclusão é que não é tão simples assim colocar a meritocracia em prática. Mas não é por isso que uma universidade pública deve expurgar a meritocracia de seu dicionário. Se não existe um sistema de recompensas proporcional ao desempenho de cada professor, a universidade gera um incentivo para que os professores tenham baixa produtividade.

Um segundo problema das universidades públicas é a insuficiência de verbas. Professores universitários são mal remunerados, pelo menos quando se compara com os cargos top da administração publica de um modo geral. Um candidato a vaga de professor em uma universidade pública tem de ser no mínimo doutor. Porém o salário pago a um professor doutor é em alguns caso menos da metade do salário pago a certos cargos da administração pública que exigem apenas o nível superior. Alguém pode me explicar qual a lógica disso?

Tenho um amigo que era professor universitário e passou em um desses concursos públicos super disputados, que pagam salários  acima de 10 mil reais. Encontrei com ele um dia por acaso e perguntei. Como vai você? Como está em seu novo emprego? Ele me respondeu que muito bem. Perguntei a ele, e o serviço, é difícil? Ele me disse: não, “é bem tranqüilo”. Ou seja, bem fácil. Mas se é bem fácil, por que o salário é tão alto? Por que uma pessoa que desempenha um serviço fácil (segundo esse meu amigo) deve receber um salário quase duas vezes maior que o de um professor doutor? É simplesmente fantástico, o governo brasileiro ao pagar salários  altíssimos para certas carreiras do funcionalismo público atrai os melhores cérebros do país para o serviço burocrático. Enquanto isso, vão seguir carreira acadêmica os que têm paixão pelo conhecimento, horror a serviço burocrático, não precisam de dinheiro, ou simplesmente não têm capacidade para passar em um concurso desse tipo.

As pessoas mais inteligentes desse país em vez de produzirem ciência, estudam para prestar concurso público. Isso é simplesmente uma aberração. Para um país se desenvolver, é necessário educação de qualidade. Para isso a carreira de professor tem de ser valorizada, tem de atrair as melhores cabeças. Não dá para contar com a postura heróica de professores mártires que vão sacrificar suas vidas em prol do desenvolvimento da nação. Pessoas talentosas querem ter bons salários e isso é perfeitamente justo.  

Para termos universidades de altíssimo nível, que figurem entre as melhores do mundo, é necessário mais verbas. Não apenas para pagar melhor os professores, mas para equipar laboratórios e salas de aula, financiar pesquisas etc. Mas de onde virá o dinheiro? Muitos podem achar que o dinheiro tem de vir do governo. Isso é o mesmo que dizer que o dinheiro tem de sair do bolso do contribuinte. Ou seja, do meu, do seu, do nosso bolso. Será justo onerar mais ainda o contribuinte? Acho que nós brasileiros já pagamos impostos demais. Além disso, a maior parte dos contribuintes brasileiros não freqüenta ou freqüentou uma universidade e, em muitos casos, seus filhos muito provavelmente também não freqüentarão. É correto que essas pessoas financiem os estudos de outras que muitas vezes têm plenas condições de pagar pelos seus estudos?

Imagine um aluno do curso de medicina da USP. Qual o custo que o governo tem para proporcionar a essa pessoa estudo inteiramente gratuito? Quanto esse aluno pagaria por um curso equivalente em uma instituição privada? Quando esse aluno se formar, irá abrir seu consultório e cobrar pelas consultas. O que o contribuinte que subsidiou a educação desse aluno recebe em troca? Nada, nada, nadinha. Você acha isso justo? Dos alunos da USP, 70% vieram de colégios particulares. Se levássemos em consideração apenas os alunos dos cursos mais disputados - medicina, direito, odontologia, engenharia etc - com certeza esse percentual seria bem superior. Ou seja, a maioria dos alunos das universidades públicas, sobretudo os dos cursos mais disputados, veio de escolas particulares. Portanto são pessoas de classe média ou classe alta, que têm condições de pagar pelos seus estudos. O ensino público superior gratuito no Brasil é um instrumento brutal de concentração de renda. Pessoas pobres subsidiam o ensino de pessoas ricas e de classe média. Nós temos um sério problema de distribuição de renda no Brasil e, para agravar ainda mais esse quadro, o ensino superior gratuito funciona como uma espécie de Robin Hood às avessas, que tira dos pobres e dá aos ricos.

USP: A MELHOR DO BRASIL E A 232a MELHOR DO MUNDO,
PRECISAMOS MELHORAR

A probabilidade de mudar esse quadro é remota, quase nula. Implantar meritocracia nas universidades públicas esbarra no corporativismo dos professores. Funcionários públicos de um modo geral não gostam de meritocracia, querem sempre que as benesses sejam distribuídas a todos, indistintamente. Com relação aos salários, professores continuarão ganhando menos que outros servidores públicos porque não têm força política para mudar essa situação. Quando professores fazem greve, o governo não dá muita importância, porém se houver uma greve entre fiscais da Receita Federal a história é bem diferente. Finalmente, cobrar mensalidade de alunos não teria apoio da sociedade. O sujeito comum que paga imposto e que nunca estudou em uma universidade pública será manipulado pela propaganda interesseira de grupos organizados e será o primeiro a protestar contra. Resumindo, tudo deve continuar do jeito que está. A única solução seria a sociedade se conscientizar desse problema e exigir que o governo promova uma mudança profunda na educação do país. Pessoas conscientes? Acho que isso é querer demais.


sábado, 23 de outubro de 2010

A CHINA É NOSSA ALIADA OU INIMIGA?


Recentemente, muitos analistas passaram a argumentar que a China atua de forma mercantilista no comércio internacional. O que significa isso? O mercantilismo foi um período da história da humanidade que durou aproximadamente trezentos anos, quando se deu a transição do feudalismo para o capitalismo. Os primeiros mercantilistas argumentavam que para um país ficar mais rico deveria exportar mais e importar menos. Com isso o país acumularia mais ouro, a moeda usada nas trocas comerciais naquela época.

O mercantilismo é uma forma completamente anacrônica de se interpretar o comércio internacional. Imagine se todos os países do mundo tentassem simultaneamente aumentar suas exportações e reduzir importações. Simplesmente não teríamos comércio, pois as exportações de um país são as importações de outro. A vantagem do comércio internacional não está no acúmulo de ouro (ou dólares), mas na especialização. Cada país se especializa na produção dos bens em que tem relativamente maior produtividade. Com isso temos uma alocação mais eficiente dos recursos e conseqüentemente um aumento do produto global. Todavia, um certo país parece não ter aprendido ainda essa lição: a China. Com seus saldos comerciais gigantescos, ela não para de acumular ouro, ou melhor, dólares. Atualmente as reservas chinesas estão em torno de 2,5 trilhões de dólares e não param de crescer.

Graças a sua moeda mantida artificialmente desvalorizada, os chineses se transformaram na grande fábrica do mundo. Quase toda manufatura que compramos vem com uma etiqueta escrito made in China. Se um pequeno país adota uma política mercantilista, não há grandes problemas. Mas quando um gigante, com uma população de aproximadamente 1,3 bilhões de habitantes, age dessa maneira, a história é bem diferente. A China com seus superávits comerciais gigantescos tem criado um desequilíbrio global. O governo argumenta que o crescimento proporcionado pelas exportações tem tirado milhões de chineses da miséria. Isso é fato. Mas o resto do mundo também deseja crescer, gerar mais empregos e reduzir pobreza. A China tem crescido às custas do crescimento do resto do mundo e isso não é justo.


CHINA: MOEDA DESVALORIZADA E MÃO-DE-OBRA BARATA,
QUEM CONSEGUE COMPETIR COM ELA?


 
Se o yuan desvalorizado já incomodava muita gente, com a atual guerra cambial passou a incomodar muito mais. Para se recuperar da crise de 2009, os Estados Unidos fizeram emissões massivas de dólares, o que desvalorizou a moeda norte-americana em relação a quase todas as outras moedas do planeta. Quase todas, o  yuan continua grudado ao dólar feito um carrapato. Se o dólar desvaloriza, a moeda chinesa desvaloriza junto. Existe uma pressão do mundo inteiro para que a China mude sua política cambial e valorize sua moeda, mas os chineses têm sido reticentes em relação a esse assunto.

Como tudo isso afeta o Brasil? O yuan desvalorizado favorece a economia brasileira de um lado e prejudica de outro. Quanto mais desvalorizada estiver a moeda chinesa, mais eles produzirão, exportarão e logicamente mais matéria-prima irão comprar do Brasil. Por outro lado, o yuan desvalorizado torna os produtos chineses extremamente baratos. Não há como competir. O Brasil corre o risco de ver sua indústria ser aniquilada pela concorrência chinesa. Os produtos chineses têm prejudicado inclusive alguns produtos brasileiros de exportação. Em 2003, 79% dos calçados importados pela Argentina eram provenientes do Brasil. No primeiro trimestre deste ano, esse percentual caiu para 57,5%. Por outro lado, a participação chinesa passou de 12,5% para 23% nesse mesmo período. Como bem observou o ex-ministro Rubens Ricupero, a China ameaça a integração econômica da América Latina.

A CHINA AMEAÇA A INTEGRAÇÃO LATINO-AMERICANA?


Como o Brasil deve reagir? Não podemos obrigar a China a valorizar sua moeda, Mas podemos engrossar o coro dos que estão tentando fazer isso. Até o momento o Brasil tem adotado uma postura de neutralidade. Muitos analistas acham que o yuan desvalorizado prejudica mais do que favorece nossa economia. Não concordo com isso, acho que o Brasil tem mais a ganhar do que perder. Em relação à nossa indústria, ameaçada pelos produtos vindos da China, o governo poderia simplesmente aumentar as alíquotas de importação. Os chineses necessitam do minério de ferro e da soja produzidos pelo Brasil e não teriam como retaliar nossas exportações. Essa é a melhor opção. Alguém consegue ver uma saída melhor?

   

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

POR QUE AJUSTE FISCAL NÃO DÁ IBOPE


Domingo passado, assisti a uma entrevista com o ministro da Fazenda. O foco era a valorização do real, a guerra entre moedas e a recente reunião do FMI em Washington para tratar sobre o tema. Nesse programa, o ministro diz que as contas públicas estão em ordem e o país não precisa de um ajuste fiscal. Você pode assistir à entrevista clicando no link abaixo:

GUIDO MANTEGA: GASTO PÚBLICO NÃO GERA INFLAÇÃO. SÓ ELE PENSA ASSIM.


Também no domingo, algumas horas antes de assistir ao programa, conversei com um amigo que está se preparando para prestar concurso público. Ele me disse que os “concurseiros” estão fazendo uma campanha na internet para eleger Dilma presidente. Tucanos têm fama de privatistas e o medo deles é que com Serra haja muito menos concursos. Mas o que a declaração do ministro sobre gasto público tem a ver com a campanha dos concurseiros a favor de Dilma? Muito mais do que você imagina.

Vamos tentar juntar as peças. De cada 10 economistas brasileiros, 11 entendem que o país deveria aproveitar a atual conjuntura para promover uma redução do gasto público. Se o país gastasse menos, não precisaria de juros tão altos para manter a inflação sobre controle. Para explicar isso, vou ter de usar um termo do “economês”: produto potencial. Mas é algo bem simples de entender. Produto potencial consiste numa estimativa do nível do PIB (Produto Interno Bruto) supondo a economia operando no seu potencial máximo, porém sem aceleração inflacionária. Quando a economia opera acima do seu produto potencial, ocorre inflação. Para eliminar esse hiato inflacionário, o governo tem de reduzir a demanda e pode fazer isso através do aumento dos juros (política monetária) ou redução do gasto público (política fiscal). Porém o governo tem agido de uma forma estranha nesse caso. Podemos dizer que nossa política econômica é um tanto quanto esquizofrênica, pois é expansiva do lado fiscal e ultra restritiva do lado monetário. Como o governo brasileiro gasta muito, o esforço fica todo concentrado do lado da política monetária. Por isso o Brasil tem uma das maiores taxas de juros do mundo.

O cenário econômico que estamos atravessando dá ao país uma oportunidade de ouro para reduzir o gasto público e aliviar a pressão sobre os juros. Nesse ano, o Brasil deve crescer 7% ou 8%. Quando o país cresce a um ritmo forte, o governo arrecada mais impostos. É muito mais fácil aumentar o superávit primário quando a economia cresce e gera mais receita para o governo. Mas se é tão benéfico assim, por que o governo então não reduz seus gastos? Muito simples, ajuste fiscal não dá ibope. Nenhum governo fica mais popular ao ajustar contas públicas. Por outro lado, aumento dos gastos agrada muita gente, o apoio dos eleitores tende a ser muito maior. A maior parte das pessoas vota de acordo com seus interesses individuais e não no que é melhor para o país como um todo. Por exemplo, se o governo cria novos cargos públicos, faz mais concursos, contrata mais funcionários ou aumenta os salários de quem já trabalha no governo, muita gente vai gostar. Talvez essa não seja a melhor política para o país, mas rende votos e apoio político.

Atualmente, o país gasta mais de 50% do orçamento com pagamento de salários e aposentadorias e somente 3% com investimento. Para piorar, o país contrata cada vez mais funcionários burocráticos e não vemos nenhuma melhora significativa na qualidade dos serviços públicos. Pode não ser bom para o país, mas inchar a administração pública rende voto. Por outro lado, se o governo faz ajuste fiscal, ninguém vai prestar muita atenção. O que significa ajuste fiscal? Como isso afeta a minha vida? Não estou muito interessado em saber.

CONCURSEIROS DISPUTAM CARGOS PÚBLICOS.

Não tenho nada contra quem está se preparando para prestar concurso. Durante muito tempo, eu fui funcionário público, mas mesmo nessa época eu não aceitava a atitude corporativista dos meus colegas de trabalho. Talvez eu fosse meio quixotesco, talvez até hoje o seja, mas acho que antes do nosso interesse individual temos de pensar no que é melhor para o país. Em outro artigo eu disse que somos todos egoístas, mas isso não é tão mau assim. Agora estou dizendo que temos que pensar primeiro no que é bom para país. Será que estou sendo contraditório? Acho que não. O egoísmo não é tão mau, mas também não é bom. Uma sociedade constituída por pessoas movidas por um auto-interesse sem limites com certeza não será boa. Um pouco de altruísmo é fundamental.

domingo, 17 de outubro de 2010

ENQUANTO GOVERNO ENXUGA GELO, PAÍS PERDE OPORTUNIDADE DE OURO

Como bem observou o ex-ministro Delfim Netto, a política de juro alto faz do Brasil o último peru com farofa na mesa dos especuladores internacionais. Por conta da crise de 2008, muitos paises reduziram os juros para próximo de zero. Enquanto isso, o Brasil tem uma taxa básica anual de 10,75%. Esse diferencial de juros faz com que muitos investidores peguem dinheiro em países com juros baixos, principalmente Estados Unidos e Japão, e apliquem no Brasil, operação conhecida como carry trade.

Outro fator que torna o Brasil e vários outros países atraentes para investidores internacionais é o crescimento econômico. Os Estados Unidos colocaram uma enorme quantidade de dólares em circulação para estimular a economia. Essa imensa massa de recursos não encontra muitas oportunidades de rendimento em países desenvolvidos, onde o crescimento é fraco e os juros estão próximos de zero. No mundo emergente, a situação é diferente, muitos países estão crescendo e as oportunidades de investimento são muito maiores. O resultado é bastante obvio: uma tsunami de recursos inunda os países emergentes, entre eles o Brasil, valorizando suas moedas

Uma moeda valorizada diminui a competitividade do país, prejudicando as exportações. Além disso, o país passa a importar mais e  pode ter problemas com suas contas externas. Nesse ano, o Brasil deve ter um déficit em transações correntes em torno de 2,5 % do PIB. Para 2011, alguns analista estimam que esse número deve subir para 3,5%.

Para conter a valorização do real, o Banco Central tem comprado dólares e recentemente o governo aumentou a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 2% para 4% para aplicações de estrangeiros em renda fixa. Essas medidas têm surtido pouco resultado. O governo alega ter outras armas para conter a valorização do real, mas até agora a política do governo se parece mais com um sujeito que tenta enxugar gelo em pelo deserto do Saara.

Como bem diz a sabedoria popular, todo problema traz consigo uma oportunidade. E é exatamente isso que acontece com a economia brasileira nesse momento. Em meio a toda essa confusão cambial, ou “guerra de moedas”, nas palavras do ministro da Fazenda Guido Mantega, o país perde uma oportunidade de ouro para reduzir a taxa básica de juros.

Além da política monetária, o governo pode usar também a política fiscal como um instrumento auxiliar de combate à inflação. Quando o governo reduz seus gastos, diminui a demanda interna e ajuda a manter os preços sob controle. E é justamente nos momentos de crescimento econômico que o país tem mais condições de reduzir gastos. Essa lição básica de economia é tão antiga que podemos encontrá-la até no Velho Testamento.

No antigo Egito, o faraó estava perturbado com um sonho misterioso. Ele sonhara com sete vacas gordas e bonitas saindo do rio Nilo. Em seguida, sete vacas magras e feias saiam do mesmo rio e devoravam as sete vacas gordas. O hebreu José interpretou o sonho do faraó como sete anos de fartura e sete anos de fome. O faraó ordenou então a construção de celeiros para armazenar grãos para os anos de fome. Essa lição tão simples, porém sábia, de poupar no período de bonança para não passar por privações no período de escassez parece não ter sido plenamente assimilada pelo governo brasileiro.


AS SETE VACAS GORDAS E AS SETE VACAS MAGRAS: UMA LIÇÃO
DE ECONOMIA NO VELHO TESTAMENTO

No ano de 2009, com crescimento econômico próximo de zero, o Brasil teve um superávit primário de 1,5 % do PIB. Nesse ano, com crescimento próximo de 7,5%, o governo terá uma receita tributária muito superior e logicamente o superávit poderia ser muito maior. Todavia, se não levarmos em consideração as receitas decorrentes das operações envolvendo a capitalização da Petrobrás, o superávit primário deverá ficar próximo de 1,5 %, ou seja, o mesmo valor do ano passado, o que é um grande absurdo. Se o governo gastasse menos, haveria mais espaço para redução dos juros. Com juros mais baixos, o país atrairia menos dólares e aumentaria sua competitividade. Mas a sanha do gasto público parece ser mais forte que o bom senso da poupança. Quem sabe a leitura do Velho Testamento não ajudasse a iluminar a mente dos nossos gestores de política econômica ...

Se você concorda com o que acabou de ler, ajude a divulgar essa idéia. Um país melhor depende de governos responsáveis e pessoas bem informadas. Resolvi escrever esse artigo após ter assistido ao programa Espaço Aberto, com a jornalista Miriam Leitão: Reunião com FMI debate guerra cambial. Para assistir ao programa, basta clicar no link abaixo:

http://globonews.globo.com/Jornalismo/GN/0,,MUL1624421-17665,00-REUNIAO+DO+FMI+DEBATE+GUERRA+CAMBIAL.html

terça-feira, 12 de outubro de 2010

SOMOS TODOS EGOÍSTAS, MAS ISSO NÃO É TÃO MAU ASSIM

Não há novidade alguma em dizer que no mundo em que vivemos existe um imenso abismo que separa ricos de pobres. O desenvolvimento tecnológico trouxe consigo uma enorme capacidade de produzir riqueza, mas mesmo assim milhões de pessoas, com renda insuficiente para satisfazer suas necessidades fundamentais, padecem na miséria absoluta. É possível um mundo diferente? Uma sociedade justa, fraterna e igualitária é possível, ou uma simples utopia?

Em meados do século XIX, o filósofo e economista alemão Karl Marx lançou as bases do que ele acreditava ser o “socialismo científico”: um novo mundo, sem desigualdade, injustiça ou exploração. Em sua obra mais importante, O Capital, Marx explica como seria esse novo mundo. Nessa nova sociedade, não haveria divisão de classes, os recursos de produção pertenceriam à coletividade e não haveria mais a exploração do homem pelo homem. Teríamos enfim uma sociedade mais justa, fraterna e igualitária.

KARL MARX

A Revolução Russa, em 1917, permitiu que as idéias de Marx fossem testadas pela primeira vez. Contudo não se pode dizer que o resultado do modelo socialista imposto pela ditadura do proletariado tenha sido exatamente um sucesso. No lugar de um conto de fadas, o socialismo transformou-se em um filme de terror. No lugar de uma sociedade justa e fraterna, construiu-se um estado despótico e cruel. Campos de trabalhos forçados, opressão, perseguições, fomes coletivas e corrupção foram apenas algumas das marcas deixadas do socialismo.

O que deu errado? Talvez o problema não estivesse na teoria de Marx. A culpa talvez fosse daqueles que tentaram implementar o novo regime, sobretudo  Stalin. Sim, provavelmente ele foi o culpado. O dirigente russo não leu, não compreendeu ou simplesmente desvirtuou a obra de Marx. O problema não estava no marxismo. Esse continuava puro, perfeito, imaculado. O erro estava na ignorância daqueles que não souberam colocar a doutrina em prática.

STALIN

Para os que ainda defendem essa tese, convém lembrar que houve tentativas de se implementar o socialismo em todos cantos do mundo. Europeus, asiáticos, africanos e latino-americanos fracassaram ao tentar aplicar o modelo marxista. O socialismo não vingou em nenhum ponto desse planeta. Após a queda do muro de Berlin, os países da zona de influência da União Soviética puderam escolher em permanecer comunistas ou buscar um outro caminho para alcançar o desenvolvimento. Coincidentemente, quase todos deram um meia volta volver à direita e abraçaram a economia de mercado. Do antigo regime, restaram apenas Cuba e Coréia do Norte, dois tristes exemplos de estado autoritário e economia falida.

 Mas por que, afinal de contas, o socialismo deu errado? O fracasso desse modelo não tem uma única causa, mas vou tratar aqui de um ponto apenas. Um equívoco monumental de Marx foi não compreender corretamente a natureza humana. As pessoas são naturalmente egoístas. Talvez um dia a genética saiba explicar melhor a razão do nosso egoísmo, mas é certo que ele não é fruto do capitalismo. Um modelo econômico baseado na livre iniciativa, na perseguição do lucro e na competição provavelmente estimula ainda mais esse traço do nosso caráter, mas o egoísmo não nasce com o capitalismo, nem o socialismo pode ser a redenção.

Quando digo que as pessoas são naturalmente egoístas, não significa que as pessoas sejam exatamente más. Significa apenas que as pessoas pensam primeiramente nelas próprias e depois nos outros. Uma ditadura instituída para promover o bem estar geral, será mais cedo ou mais tarde capturada por pessoas egoístas que se utilizarão do poder a elas atribuído para obter benefícios privados, porque essa é a verdadeira natureza humana.

O escritor inglês George Orwel, através de uma sátira inteligente e divertida chamada A Revolução dos Bichos, demonstra justamente isso, como a quimera de um paraíso comunista sucumbe perante o egoísmo humano. Em uma fazenda, animais, explorados por humanos resolvem fazer uma revolução. Liderados pelos porcos, eles tomam o poder. Mas com o passar do tempo, os porcos transformam-se na nova classe dominante e passam a explorar os outros animais e a agir da mesma forma interesseira, egoísta e cruel que os humanos.

 A REVOLUÇÃO DOS BICHOS

Se o ser humano é egoísta, então não é possível melhorar a sociedade? Estaremos condenados a viver eternamente em um mundo cheio de sofrimento, privações e injustiças? Bem, as coisas não são assim tão dramáticas. Nós seres humanos somos naturalmente guiados pelo auto-interesse. Mas isso não é tão ruim, podemos até encontrar algo de positivo nisso.

Adam Smith, pensador liberal do século XVIII e considerado por muitos o pai da economia moderna, no seu livro clássico Uma Investigação sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações, escreveu:

"não é da benevolência do padeiro, do açougueiro ou do cervejeiro que eu espero que saia o meu jantar, mas sim do empenho deles em promover seu auto-interesse".

Em uma parte outra parte do mesmo livro, Smith imortalizou uma expressão para explicar o funcionamento de uma economia de mercado. Pessoas buscam sempre o interesse pessoal, mas são guiadas por uma “mão invisível” a produzir um benefício social. A “mão invisível” representa o sistema de preços que regula o funcionamento do mercado. Essa é até hoje a metáfora mais famosa da economia.

"Assim, o mercador ou comerciante, movido apenas pelo seu próprio interesse egoísta, é levado por uma mão invisível a promover algo que nunca fez parte do interesse dele: o bem-estar da sociedade."
 ADAM SMITH

Mas o egoísmo humano não pode ser destrutivo? O filósofo inglês Thomas Hobbes, aproximadamente cem anos antes de Adam Smith, concluiu exatamente isso. Nas palavras de Hobbes, “o homem é o lobo do homem”, pessoas guiadas por um auto interesse sem limites, pelo desejo de poder e riqueza irão deflagrar uma guerra de todos contra todos. Essa é a verdadeira natureza humana. Para evitar a guerra civil permanente, as pessoas concordam em abrir mão de parte parte de sua liberdade e criam o estado. A esse, Hobbes deu o nome de um monstro mitológico: Leviatã. Ou seja, para protegerem de si próprias, as pessoas criam um monstro e dão a ele poderes para controlar as pessoas. Mas quem irá controlar a criatura? Essa é uma questão interessante, mas que foge ao escopo desse artigo, então não vamos nos aprofundar nesse ponto.

 O LEVIATÃ

O que diria Smith sobre o Leviatã? O pai da economia moderna era mais otimista em relação ao ser humano. As pessoas são auto-interessadas, mas, apesar disso, são capazes de desenvolver empatia, de se colocar no lugar do outro e estabelecer regras para o seu próprio comportamento. Portanto, somos egoístas, mas nosso egoísmo é limitado por regras auto-impostas e não se degenera para um estado de natureza hobbesiano. Smith é um excelente exemplo do que hoje chamamos de humanista laico ou secular, uma pessoa que refletiu e teorizou sobre como, baseando-se na razão e não na fé, crenças ou religião, é possível construir uma sociedade melhor e mais justa.

Bem, sobre justiça, há muito que falar. Talvez esse seja o meu próximo tema. Nesse artigo, tratei apenas do egoísmo humano e suas consequências. Fique à vontade para comentar o que você  acabou de ler, quer você tenha gostado ou não. O importante é debater ideias. Até uma próxima.